Toda a lei se resume num só mandamento: "Ame o seu próximo como a si mesmo". — Gálatas 5.14
Alguns dos antigos pais da igreja, baseando-se nessa passagem, concluíram que o amor ao outro começa com o amar a si mesmo. Eles disseram isso porque a instrução de amar a si mesmo foi dada como a medida do quanto você deve amar o seu próximo. Eu costumava analisar essa afirmação a partir de todos os pontos de vista, na busca por compreendê-la. Entendo que o que esse mandamento ordena é apenas o amor direcionado ao próximo, não o amor direcionado a si mesmo.
Primeiramente, porque o amor próprio já está presente em todas as pessoas. Em segundo lugar, porque, se Deus tivesse a intenção de dar um mandamento para amar a si mesmo, ele teria dito: "Você deve amar a si mesmo e ao seu próximo como a si mesmo". Mas, em vez disso, ele disse: "Ame o seu próximo como a si mesmo". Em outras palavras, "como a si mesmo" significa a maneira como você já se ama, sem um mandamento para fazê-lo. Quando descreve o amor, em 1 Coríntios 13.5, Paulo ensina que o amor não procura os seus próprios interesses, antes rejeita o amor próprio completamente. Em Marcos 8.34, Cristo nos ordena negar a nós mesmos. Filipenses 2.3-4 diz claramente: "Humildemente considerem os outros superiores a si mesmos. Cada um cuide, não somente dos seus interesses, mas também dos interesses dos outros". Esse mandamento pressupõe que as pessoas já amam a si mesmas, assim como quando Cristo diz, em Mateus 7.12: "Assim, em tudo, façam aos outros o que vocês querem que eles lhes façam". Está claro, assim nesta passagem como naquela, que ele não está ordenando que você se ame.
Assim, parece-me que a parte do mandamento que diz: "como a si mesmo" está se referindo ao tipo errado de amor – o tipo em que você se esquece do seu próximo e procura somente os seus próprios interesses. Mas isso pode se tornar o tipo correto de amor se você se esquecer de si mesmo e pensar somente em servir ao seu próximo.
>> Retirado de Somente a Fé – Um Ano com Lutero. Editora Ultimato.