Começamos então a perceber a nossa própria pecaminosidade, além dos atos pecaminosos em particular.
Começamos a ficar alarmados não apenas com o que fazemos, mas com o que somos. Como isso pode parecer muito difícil de entender, vou tentar esclarecer o meu próprio caso.
Quando faço as minhas orações à noite e tento lembrar dos pecados do dia, em noventa por cento das vezes, o mais evidente de todos os pecados acaba sendo o da falta de misericórdia: fui mal-humorado ou rabugento, ou sarcástico ou implicante. E a desculpa que imediatamente aparece é que a provocação foi tão repentina e inesperada que não tive tempo de me dominar. Ora, essa pode ter sido uma circunstância extrema, relacionada com aqueles atos em particular: eles obviamente seriam piores, se tivessem sido deliberados e premeditados.
Por outro lado, a reação de uma pessoa quando é pega de surpresa não é a melhor evidência do tipo de pessoa que ela é? Será verdade o que aparece diante dos olhos antes de se colocar um disfarce? Se há ratos no porão, é mais provável você os apanhar se entrar de repente. Porém, o repente não cria os ratos; apenas impede que se escondam.
Da mesma forma, o fato de a provocação ter sido repentina não me torna uma pessoa mal-humorada; ela apenas mostra meu próprio mau humor. Os ratos sempre estarão no porão, mas se você entrar gritando e fazendo barulho, eles acabarão se escondendo antes de você acender as luzes.
>> Retirado de Um Ano com C. S. Lewis, Editora Ultimato.