Menos legalismo
// Lagoinha
Você já parou para refletir que o único grupo de pessoas que Jesus realmente combateu foram os religiosos legalistas? Jesus não bateu de frente com os romanos, judeus nominais ou pecadores em geral. A estes, Ele deu Sua graça, presença, Palavra, compaixão e amor, porque como disse "eram ovelhas sem pastor". Mas Jesus enfrentou e confrontou os religiosos legalistas do Seu tempo de forma firme e contundente, sem poupar duras palavras. Por quê? Simplesmente porque eles conheciam a verdade e não eram ignorantes como os gentios da sua época. Em nossos dias, podemos dizer que Jesus pegou pesado com eles, ao usar expressões como estas: "Ai de vocês, mestres da lei e fariseus, hipócritas! Vocês limpam o exterior do copo e do prato, mas por dentro eles estão cheios de ganância e cobiça" (Mateus 23.25).
E o que este fato deve comunicar para cada um de nós, cristãos, hoje? Muita coisa! Entenda, pode parecer um tanto estranho e até incoerente, mas temos que admitir que como cristãos conhecemos pouco da graça e do amor de Deus. É estranho porque basicamente o cristianismo é fundamentado na teologia da graça de Deus, a qual afirma que o Eterno Deus, misericordiosamente, nos amou e enviou o Seu filho Jesus Cristo para a nossa salvação. Como está escrito em um dos versos mais destacados do Novo Testamento: "Porque Deus tanto amou o mundo que deu o seu Único Filho, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna" (João 3.16). Diante disso, deduz-se que toda a ação amorosa de Deus em torno do ser humano é permeada pela graça, que etimologicamente significa "favor imerecido", ou seja, não há em nós absolutamente nada que possa atrair o mínimo do cuidado de Deus. Não somos merecedores de qualquer bênção dos céus, mesmo aquelas que consideramos comuns, como a bênção de respirar, a bênção de ver a luz do sol a cada manhã, ou mesmo, de desfrutar da refrescante chuva após uma tarde de calor. Todos nós precisamos de uma porção maior da prática do amor, da graça e da tolerância. Não podemos criticar, julgar, "meter a boca" (inclusive pela internet) em alguém, porque discordamos de sua ideia, pensamento ou mesmo do modo de viver.
Não é curioso que sendo toda a história da salvação permeada pela graça divina conheçamos tão pouco desse atributo de Deus? Talvez a explicação para isso esteja no lado oposto da graça, onde mora o legalismo e a religiosidade humana. O legalismo é uma forma de ver a vida e, também, uma forma de se relacionar com Deus e com as pessoas. Trata-se de uma proposta de vida baseada em pressupostos de justiça própria – a ideia é que as atitudes de justiça por parte do indivíduo concederão a ele direitos em relação às bênçãos de Deus e a vida melhor que Jesus pode nos dar. Sendo assim, a pessoa legalista experimentará um sentimento interior de possuir crédito junto ao Todo Poderoso. De forma prática, a proposta do legalismo funciona assim: a pessoa aprende que quanto mais reta for sua vida, maiores serão as bênçãos que alcançará. Então passa a tentar agradar a Deus com atitudes que entende serem de acordo com os princípios bíblicos aprendidos. No entanto, descobre que isso nem sempre é possível em função de suas limitações e de sua natureza pecaminosa. A partir daí, começa a experimentar uma culpa interior por ser pecadora, por desagradar a Deus, por sentir-se em débito com o Eterno e por achar que, a qualquer momento, Ele irá castigá-la. Sendo assim, se esforça ainda mais para cumprir os preceitos bíblicos a fim de agradar a Deus. Como não consegue, passa a experimentar uma culpa ainda maior e um sentimento de inadequação. Começa a pensar que Deus já não ama como antes e que a qualquer momento poderá perder a sua salvação.
A sua religião se torna neurótica e o indivíduo passa a viver sob o peso insuportável de um julgamento interior (de si mesmo) e exterior (da lei). Este é um momento perigoso em que algumas coisas podem acontecer: a pessoa se desequilibra emocionalmente, passa a ter vida dupla e se torna um cristão problemático ou abandona a fé, culpando alguém ou carregando culpa, mágoa e dor para o resto de sua vida. Esta é a razão pela qual há um grande número de pessoas ligadas à fé cristã que estão deprimidas, isoladas e, até mesmo, internadas nos hospitais psiquiátricos. E outras estão azedas, amargas e até revoltadas com a família e com as instituições religiosas.
É importante ler a Bíblia, ter uma fé cristã saudável, equilibrada e de bom senso, não tendo expectativas erradas sobre a realidade humana e a proposta de Deus para cada um de nós. Jesus deseja que as pessoas que o seguem sejam sadias emocional e espiritualmente. Precisamos retornar à mensagem da graça de Deus, que diz que o Pai Celestial nos aceita como somos, que nos ama do mesmo jeito a cada dia, que nos abençoará tão somente pela Sua misericórdia e não em função de nossas ações. Entender a graça de Deus significa entender que o Eterno não reagirá às nossas ações, mas somos nós que reagimos às Suas ações de amor e de cuidado constante. Se servimos a Deus, vivemos de forma íntegra e procuramos agradar a Ele, não é apenas porque achamos que isso atrairá as bênçãos dos céus sobre nossas vidas. Mas agimos assim como uma resposta de amor a um "amor maior".
Estou convicto de que precisamos de uma fé que tire a pressão, em vez de aumentar o peso sobre nossos ombros. Precisamos de menos condenação e mais amor, esta é a lei de Deus segundo Jesus (Mateus 22.34-40) e, portanto, não existe nada maior. Talvez precisemos ouvir do Eterno as mesmas Palavras que o apóstolo Paulo ouviu em determinado momento de sua vida: "Minha graça é suficiente para você, pois o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza" (2 Coríntios 12.9). Isso pode aquietar nosso coração, nos tornar pessoas mais tranquilas e serenas com um coração cheio de fé e amor e não cheio de religiosidade fundamentalista ou idólatra. Inspirados num ambiente de amor e graça, mediante a um relacionamento pessoal de amor com a pessoa de Jesus em nossa vida. A diversidade do mundo aumentará e o amor esfriará, portanto vamos aumentar o amor e a graça, todos vamos precisar. Que nossa vida e, consequentemente, nossa comunidade seja conhecida mais pelo seu amor e pela graça, do que pelas regras, leis e legalismos da religiosidade.
::Carlito Paes